Diante de um ano atípico, o mercado da farinha foi beneficiado em suas margens até o primeiro semestre. A preocupação com a pandemia da Covid-19 levou os consumidores aumentarem seus estoques domésticos do produto, porém, a matéria-prima atingindo valores históricos em plena colheita, retraiu as negociações no mercado da farinha, em um cenário em que os reajustes nas precificações eram imprescindíveis
O ano de 2020 já iniciou com dificuldade para o setor moageiro de trigo. A safra nacional de trigo em 2019 apresentou perdas expressivas na produção, que além de reduzir a oferta, agregaram aumentos na cotação do grão, gerando um colapso no mercado de trigo e derivados.
No início do ano os moinhos já se mobilizaram para realizar os repasses dos custos, frente a baixa disponibilidade do cereal, e o aumento do dólar ante o real. A valorização do dólar, veio motivada pelo contagio mundial do Coronavírus, que se originou na China em dezembro de 2019, gerando incertezas frente a economia mundial.
No final do primeiro trimestre, a preocupação de como os estoques de trigo para moagem seria preenchido se agravou. De um lado as processadoras, necessitavam de reposição e o patamar elevado do cereal exigia reajustes de preços. De outro, a demanda se encontrava retraída, com a distorção do mercado da farinha, aonde moinhos com grão comprados anteriormente a um preço mais baixo não efetuavam acréscimos nos valores da farinha, enquanto que demais indústrias que estavam comprando naquele momento que o grão estava subindo, só tinham como alternativa realizar o repasse do custo aos consumidores.
Na metade de março a pandemia do Covid-19 chegou ao Brasil, e a quarentena foi decretada em todo o país. O vírus, até então um tanto quanto desconhecido mundialmente, afetou os moinhos, reduzindo a jornada de trabalho e consequentemente a moagem, com rodízios de funcionários e até fechamento das indústrias.
Todavia, com o vírus alojado em todas as regiões do país, os compradores aumentaram a demanda para consumo doméstico, já que as pessoas começaram a estocar alimentos em casa, e o que seria processado em um mês teve que ser produzido em somente 15 dias para atender a procura.
Neste momento, houveram diferentes movimentações, onde o mercado observou a queda na demanda das farinhas para panificadoras e para massas, já que os decretos para a contenção da Covid-19 impossibilitavam o trabalho de restaurantes, bares e circulação de pessoas. No entanto, as farinhas para biscoitos, macarrões e empacotados de 1 a 5 kg, ficaram aquecidas, auxiliando no repasse de preços necessários para o mercado moageiro de trigo, se estendendo durante o período de abril a junho.
No decorrer do segundo semestre, as flexibilizações sobre o isolamento social foram ocorrendo, de acordo com a diminuição de contagio do Coronavírus em cada cidade. Mas por se tratar de uma doença sem precedentes, as pessoas evitaram sair, e o quadro econômico ruim também reprimiu a volta da população a frequentar panificadoras e restaurantes, limitando a recuperação da demanda da farinha de trigo para determinados produtos.
Com a incerteza da demanda, já que compradores tinham estoques e consumidores deixaram de produzir seus próprios acervos. Os moinhos na sua maioria decidiram por negociar a matéria-prima mais próximo da colheita, na esperança de preços mais baixos.
Tanto que em setembro, houve moageiras negociando contratos com o valor da farinha próximo ao custo do grão, para ganhar na quantidade e conquistar os clientes. No entanto, com o produtor retendo a oferta, os índices atingiram aumento de 106% na matéria-prima em plena colheita de trigo em algumas regiões, e isso agravou ainda mais a situação dos moinhos que necessitavam melhorar a paridade entre o derivado de trigo e o custo de produção.
As negociações da farinha de trigo seguiram em baixa até o final do ano, reflexo de impasses entre ponta compradora que pressionava redução de preços e moinhos, que preferiram rever contratos e diminuir a moagem para chegar nesse final de ano em margens positivas.
Para o próximo ano, se espera que a demanda melhore com a reposição de estoques. A cadeia produtiva de trigo deve usar este ano como aprendizado, observando erros e acertos, e de forma cautelosa projetar o próximo ciclo com maior rentabilidade.
Cotação da farinha
A perda da safra 2019/20 já indicava que o ano seria de custos mais elevados para aquisição da matéria-prima, sinalizando que os reajustes seriam essenciais para os moinhos permanecerem com o caixa em margens positivas.
Em comparativo anual, a farinha comum tipo I em janeiro, foi a única que ficou abaixo do valor operado em 2019. No Rio Grande do Sul, houve queda anual de 2,3% e Rio de Janeiro, com recuo de 1,2%. No restante das regiões (PR, SP, MG) acompanhadas pela AF News Agrícola, os reajustes de janeiro de 2020, no tipo comum I, ficaram com valorização entre 1,43% a 10,9%, superiores ao mesmo período de 2019.
Na variação entre janeiro a dezembro de 2020, os mais relevantes incrementos ocorreram no Estado do Rio Grande do Sul, entre 33% a 71%, com ressalva da farinha especial. Demonstrando que os moinhos gaúchos estavam com os estoques de trigo (matéria-prima) baixos. Além disso, os índices de alta no dólar dificultaram a reposição do trigo importado e por isso, a alternativa foi reduzir a moagem e aumentar os preços.
No entanto, quando se observa o patamar que o preço da saca de trigo alcançou, ficando próximo aos R$ 80,00 no Rio Grande do Sul, 106% superior as margens de 2019, se nota que os repasses não aconteceram na mesma velocidade no mercado da farinha de trigo.
Todas as regiões acompanhadas pelos agentes da AF News Agrícola, apresentaram aumento de preços em todas as tipificações de farinha.
No segundo semestre, somente a massa fresca subiu menos que 35%, o restante dos aumentos chegaram 87% em novembro. O que diferenciou os acréscimos foram a demanda e as regiões. Todavia, os reajustes nos índices foram passados gradativamente pelas indústrias moageiras, até alcançarem os maiores patamares.
A procura dos compradores para obterem estoques em meio à pandemia, beneficiou os repasses de preços das farinhas. No entanto, após agosto, os incrementos tiveram dificuldades de serem aceitos, reduzindo as negociações. Vale constar que alguns moinhos, quando não fechavam negociações com incrementos nos preços, optavam por manter o produto em estoque na indústria, e para as indústrias com menores espaços a solução foi a redução da moagem. Sendo esta a forma saudável da processadora enfrentar o período de custos altos de produção e procura escassa dos derivados de trigo.



Confira os dados das importações da farinha de trigo em 2020:


